segunda-feira, 10 de abril de 2017

Contexto histórico

Dictionary of Witchcraft, com o título original de Dictionnaire Infernal, e Dicionário Infernal, em português, é um livro escrito por Jacques Auguste Simon Collin de Pancy, publicado em 1818 na França, mas foi traduzido em diversos outros idiomas e alcançou maior popularidade quando, em 1863 ganhou ilustrações de Louis Breton. O livro trata de superstições, magia e, o que este trabalho busca abordar, figuras muito trabalhadas especialmente pela religião Católica, como a existência das bruxas e dos demônios.  Na Idade Média, e com a ascensão da Igreja Católica, houve uma grande mobilização contra os chamados “inimigos da Igreja”. Muitas pessoas eram presas e executados em público por acusações de bruxaria e feitiçaria. Além disso, a crença de demônios que se apossavam dos corpos mais frágeis era forte e muita marcada. Embora a famosa “Caça às bruxas” tenha se iniciado justamente nesse período, em especial no século XV, ela continuou ganhando força nos séculos seguintes, tendo seu apogeu principalmente no século XVIII. O livro foi publicado quando todas essas crenças eram muito fortes, e não simples superstições.

Novas Cartas Portuguesas, por outro lado, é publicado num contexto muito diverso. Em 1974, em Portugal, a Ditadura trazia uma série de limitações e repressões não só políticas, mas de crenças, de comportamento, entre outros. O livro surge não só como um grito contrário a esse momento político em Portugal, mas contra a situação da mulher no país. A Ditadura impedia outros avanços, como a Revolução sexual, com início em 1960, em outros países do mundo. As três Marias unem-se e publicam um livro que contém uma série de cartas, que vão desde confissões até manifestações que se aproximam da poesia, denunciando a situação da mulher em Portugal. Usam como base o livro Cartas Portuguesas (Les Lettres Portugaises), publicado na França em 1669, que contém as cartas de Soror Mariana, uma freira que envia cartas de amor a um francês. Além das cartas de Mariana, o livro Novas Cartas Portuguesas também apresenta escritos de outras mulheres, sejam freiras ou esposas e mães, conscientes ou não da situação de repressão que se encontram, que acabam denunciando o poder do Estado, da sociedade e da Igreja em subjugá-las e oprimi-las.

Apesar de aproximadamente um século de diferença entre as obras, fica claro que em ambos os casos, a mulher continua sendo vista como submissa, tendo desde o nascimento o destino traçado: seguir a vocação religiosa, ou constituir família, assumindo apenas o papel de mãe e esposa devotada. As mulheres que, eventualmente, saíam desse padrão ou se rebelavam de qualquer forma, eram vistas como bruxas e feiticeiras. Aquelas que expressavam qualquer sexualidade eram tachadas de perversas ou possuídas por demônios. Suas manifestações sexuais envolviam o próprio Diabo e, vítimas de abuso, toda a culpa era destituída do homem, sendo atribuída à própria mulher, que o enfeitiçava com seu corpo ou seu jeito de ser. É importante então traçar um paralelo entre duas épocas completamente diferentes, mas ligadas fortemente pelos julgamentos religiosos e superstições, usados para justificar parte da opressão contra a mulher, e atentar à figura da bruxa, que representa a mulher que se rebela contra as imposições ao mundo feminino.

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